Uma varanda. Pequena. Com 2 vasos de jasmin. Nada mais. O idoso era meu amigo. Sentavamos, no por do sol, para passearmos a mente e a disputa dos livros que lemos durante o dia. Nem todos os dias o velho queria falar. Nao era necessario. Murmurava na jarra que regava as flores. Como a varanda era um espaco pequeno, eramos amigos encostados e carentes de qualquer dialogo.
Hoje faz 5 anos. O velho deixou de falar. A ultima palavra foi para pedir que leve o vaso de jasmin comigo. Neguei. Nao tinha tempo para tamanho sacrificio de cuidar de plantas e rega-las 3 vezes por dia. Nao contestou, eramos amigos. Aprendemos ao longo dos anos a dizer nao, era a nossa maneira de contrariar o mundo passivo que rodeiava nossa vida. E o velho assim devagarinho abracou-me, fiquei estatico e confuso. Afinal estes anos todos nunca nos abracamos. Podiamos rir e tocar o ombro do outro para chamar atencao sobre o poema que nao sabiamos declamar. O abraco foi forte, como um arrame que enrola um presente perdido. Perguntei porque do abraco. Encolheu os ombros e riu-se, o velho nao ria muito. Durante anos resolvi procurar na ruga e na barba escura algum sorriso. Tarefa dificil, nao havia dentes para contar, havia uma pequena ruga que atravessava o labio inferior. Quando a leitura era boa, a ruga desaparecia do labio. O unico sinal sorridente que aprendi a apreciar.
Cincos anos passaram tao rapido, mas hoje o dia esta lento. O vellho nao mais pode andar. A cegueira veio tao rapida como o sol que deita rapido. Estes dia leio sozinho, contemplo solitario o por do sol. Ao meu lado o velho estica-se, mexe a barba e a cinza que cai do cigarro russo que fumamos. A unica coisa que partilhamos da nossa ultima viajem a russia, perseguiamos a biografia do Neruda e Tolstoi. Na russia aprendemos que temos que fumar forte para ler.muitos anos passaram e a biografia acabou esquecida, a viajem faziamos todos os dias na enciclopedia russa e na revista Pravda. Para alem do sol, da lua, e passaros, no quinto andar somos os ultimos vizinhos, num edificio para pensionistas do exercito.
O velho de nome Armando foi um combatente, de uma companhia de artilharia. Nunca atirou, era comissario politico. Aprendeu a escrever a maquina e a ler sobre a revolucao no exercito. Segredeu-me que escreveu muito sobre a poesia de combate, era a unica poesia que nao passava pela censura. Nunca publicou. Nao havia tempo. A guerra e educacao politica do militar era importante. Segredou-me zangado. Hoje recebeu a carta do hospital militar, so pode receber tratamento se for internado. Nunca disse o velho. E escrevi nunca na carta respondendo ao medico. para Armando a morte no hospital nao tem sentido. com a velhice nao se luta, escreveu no poema 358.