quinta-feira, outubro 30, 2008

(des)mamar um pais II

Diz-se que a sorte foge. Tem pernas mais compridas que a vida de muita gente. Será possível? Alguns homens dizem que sim. Um paradoxo ate mesmo para quem do azar esquiva-se.
Nunca perguntei sobre o pêndulo que segura a sorte, o tempo para esse questionamento sempre dependeu do lugar que empresto as perguntas do quotidiano. Manuel, nome de um moçambicano qualquer, porque nunca contou na sorte. Tem pernas mais curtas, um bebé com tamanho de adulto. Afinal a sorte mede-se pelos saltos exagerados de quem acredita conhecer o progresso.
Para Manuel a sorte diz tudo, comanda ate coisas inexplicáveis. Tem olhos que trazem o futuro para bem mais perto do lugar mais perfeito do quintal: o cajueiro que sem sorte já não faz sombra.
Antigamente era a castanha que crescia por fora do fruto, hoje é o Manuel que faz a sua vida fora do seu quintal. Nas tardes o Manuel senta-se à beira da estrada, empoeirado – em parte porque a sorte nestes dias só faz chover poeira. Manuel diz que a terra deixou de ressuscitar, toda a sorte que a terra coleccionou durante anos foi sobreviver para outro mundo. Evaporou-se.
O Manuel aprendeu no secretismo dos dias passados a beira da estrada a fala dos estranhos. Eu sou esse estranho da sorte. Cheguei aqui para perseguir a sorte que não se encontra no progresso de uma cidade.
Manuel não entende essa sorte que leva-nos para lugares despidos de sorte. Nos jovens temos uma bússola desparafusada, alertou-me noutro dia.
Expliquei ao Manuel de que sou um fruto suspenso debaixo de um ramo seco: Filho do vento. O vento é a minha bússola, quebrado o ramo, o meu destino depende da forca do vento. Posso cair em quintais de outra sorte. Riu-se.